domingo, 13 de fevereiro de 2011

Matéria da FOLHA DE SÃO PAULO - Crise Mundial de Alimentos

A crise mundial de alimentos tem sido tema recorrente em debates e manchetes de jornais. Vale apena dar uma lida nessa matéria da Folha de São Paulo, pois esse é um tema forte para os vestibulares de 2011!!!!

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Volatilidade de preços e crises alimentares

JACQUES DIOUF


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Sem decisões que permitam mudanças estruturais a longo prazo, acompanhadas de vontade política, a insegurança alimentar global permanecerá
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A história precisa ser sempre um eterno recomeço? Estamos enfrentando o que poderia ser uma outra grande crise alimentar.
O Índice de Preços dos Alimentos da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação) voltou a atingir seu nível mais alto no final de 2010.
E, nos próximos anos, a volatilidade e os preços continuarão altos, se não atacarmos as causas estruturais do desequilíbrio do sistema agrícola internacional. Seguimos reagindo a fatores conjunturais e, portanto, a gerenciar crises.
Até 2050, será necessário aumentar em 70% a produção agrícola mundial e em 100% nos países em desenvolvimento.
Para isso, a primeira e mais importante questão é a do investimento: a participação da agricultura na ajuda oficial ao desenvolvimento agora está em torno de 5%, e deve retornar ao patamar de 19%, de 1980, alcançando os US$ 44 bilhões por ano.
O orçamento destinado à agricultura pelos países de baixa renda e importadores de alimentos, que hoje gira em torno dos 5%, deveria atingir um mínimo de 10%, e os investimentos privados nacionais e estrangeiros, que representam cerca de US$ 140 bilhões por ano, deveriam subir para US$ 200 bilhões.
Esses valores são uma fração do que se gasta anualmente na compra de armas, em torno de US$ 1,5 trilhão. Em seguida, temos o comércio internacional de produtos agrícolas, que não é livre nem justo.
É preciso, ainda, chegar a um consenso nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) para colocar fim à distorção dos mercados e das medidas comerciais restritivas.
Os países da OCDE proporcionam à sua agricultura um apoio equivalente a quase US$ 365 bilhões por ano, e seus subsídios e proteção tarifária a favor dos biocombustíveis causam o desvio de 120 milhões de toneladas de cereais do consumo humano para o setor de transportes.
Por último, temos a especulação financeira exacerbada pelas medidas de liberalização dos mercados futuros de produtos agrícolas, em um contexto de crise econômica e financeira. Essas condições tornaram instrumentos de arbitragem de risco em produtos financeiros especulativos que substituem outros investimentos menos rentáveis.
É urgente introduzir novas medidas de transparência e de regulamentação para fazer frente à especulação nos mercados futuros de produtos agrícolas.
Em um contexto também incerto do ponto de vista climático, marcado por inundações e secas, é necessário poder financiar pequenas obras de controle de água, meios de armazenamento locais e estradas rurais, assim como portos de pesca e matadouros.
Só dessa forma será possível garantir a produção de alimentos e melhorar a produtividade e a competitividade dos pequenos agricultores, diminuindo os preços ao consumidor e aumentando a renda das populações rurais, que representam 70% dos pobres no mundo.
A aplicação dessas políticas globais deve ser baseada no respeito dos compromissos assumidos pelos países desenvolvidos e em desenvolvimento.
A gestão de crises é importante, mas a prevenção é melhor. Sem decisões que permitam mudanças estruturais a longo prazo, acompanhadas de vontade política e dos recursos financeiros necessários para sua aplicação, a insegurança alimentar permanecerá.
Isso dará margem a instabilidade política em diversos países e poderá ameaçar a paz e a segurança mundial. Se não forem seguidos por ações, os discursos e promessas das grandes reuniões internacionais apenas aumentarão a frustração e a revolta em um planeta cuja população vai aumentar dos atuais 6,9 bilhões de pessoas para 9,1 bilhões no ano de 2050.
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JACQUES DIOUF é diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação.